Artigo Original 2 - Bolsa de Colostomia ou Sistema Oclusor: Vivência de Colostomizados

Authors

  • Iraktânia Vitorino Diniz Enfermeira. Estomaterapeuta (UPE), Formação Pedagógica na área de Saúde Enfermagem (FIOCRUZ).
  • Maria Genilde das Chagas Araújo Campos Enfermeira. Estomaterapeuta (UPE). Pós graduanda em Enfermagem Dermatológica.
  • Josilene de Melo Buriti Vasconcelos Enfermeira. Doutoranda em Enfermagem Fundamental pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo EERP/USP. Docente do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
  • Denyse Luckwü Martins Enfermeira. Mestre em Enfermagem (UFPB), Enfermeira da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Universitário Lauro Wanderley (UFPB).
  • Francisca de Sousa Barreto Maia Enfermeira da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Universitário Lauro Wanderley (UFPB).
  • Maria Helena Larcher Caliri Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Associada do Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – EERP/USP.

Abstract

ResumoEstudo exploratório, qualitativo, objetivou apreender o significado atribuído à colostomia e caracterizar a experiência dos colostomizados com o uso da bolsa de colostomia e do sistema oclusor. Foi realizado em uma Associação de Estomizados, em João Pessoa – PB, com quatro colostomizados, que utilizavam o sistema oclusor em alternância à bolsa de colostomia. As informações foram coletadas por meio dos depoimentos dos pacientes em grupo focal, após aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley. Os dados foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo. Os resultados mostraram o impacto da colostomia na vida dos pacientes, a dificuldade de adaptação ao uso da bolsa de colostomia ou do sistema oclusor e a importãncia do sistema oclusor como meio de promover melhorias em aspectos da vida íntima e social dos usuários. Ressalta-se a importância do uso do sistema oclusor de colostomia para a melhoria da adaptação de colostomizados.Descritores: Assistência de enfermagem. Colostomia. Adaptação.AbstractThis was an exploratory qualitative study aimed at understanding the meaning assigned to colostomy and characterizing the experience of colostomy patients with colostomy bags and the plug system. This study was conducted with four colostomy patients from the Ostomy Patients Association, in João Pessoa, PB, Brazil, who used colostomy plug alternating with a colostomy bag. The information was collected through testimonials from patients of a focus group after approval by the Research Ethics Committee of the Lauro Wanderley University Hospital. Data were analyzed using the content analysis technique. Results showed the impact of colostomy in the patient’s life, the difficulty of adapting to the use of colostomy bags or colostomy plug, and the importance of colostomy plugs in improving aspects of the intimate and social lives of users. We highlight the importance of the use colostomy plugs to improve the adaptation of patients to the colostomy.Descriptors: Nursing care. Colostomy. Adaptation.ResumenEste estudio exploratorio cualitativo, tuvo como objetivo aprehender el significado asignado a la colostomía y caracterizar la experiencia del uso de la bolsa de colostomía y el sistema de oclusión. Se llevó a cabo en la asociación de ostomizados, en Joao Pessoa – PB, con cuatro portadores de colostomías que utilizaban el sistema de oclusión intercambiando a la bolsa de colostomía. La información fue recolectada a través de entrevistas en grupo focal, después de su aprobación por el comité de Ética e Investigación del Hospital Universitario Lauro Wanderley. Los datos fueron analizados mediante la técnica de análisis de contenido. Los resultados mostraron el impacto de la colostomía en la vida de los pacientes, la dificultad de adaptación al uso de la bolsa de colostomía o del sistema de oclusión y la importancia del sistema de oclusión como un medio de promover la mejora de los aspectos de la vida social e íntima de los usuarios. El presente trabajo subraya la importancia del uso relacionado con el sistema de oclusión para favorecer la adaptación de los pacientes colostomizados.Palabras clave: El cuidado de enfermería. Colostomía. Adaptación.IntroduçãoO termo estomia origina-se da palavra grega stoma que significa abertura ou construção de uma nova boca de causa cirúrgica, a qual é feita quando há necessidade de desviar, temporária ou permanentemente o trânsito normal da alimentação e/ou eliminações. Recebe denominação específica mediante sua localização no segmento corpóreo, tal como: traquéia (traqueostomia), íleo (ileostomia), cólon (colostomia)1.As condições clínicas importantes que levam à realização de uma estomia intestinal estão relacionadas às patologias benignas ou malignas do órgão, traumas e cirurgias gastroenterológicas. Dentre estas, a colostomia é a mais freqüente e caracteriza-se pela exteriorização do cólon através da parede abdominal, com o objetivo de eliminação fecal. Pode ser realizada no cólon ascendente ou direito, no cólon transverso ou transversostomia, cólon descendente ou esquerdo e no cólon sigmóide2.A AssociaçãoBrasileira de Ostomizados (ABRASO) informa que o quantitativo aproximado de pessoas estomizadas no Brasil corresponde a 33.864, embora não constem nestes dados informações do Amapá, Tocantins e Roraima. Deste quantitativo, 4.176 correspondem a estomizados da região Nordeste e 496 ao estado da Paraíba. Convém ressaltar que o número de estomizados é maior, pois existem subnotificações, as quais estão relacionadas com os portadores de estomias que não procuram as associações dos estomizados 3.De acordo com a declaração dos direitos dos estomizados, estabelecida pela Associação Internacional dos Estomizados, em junho de 1993 e revisada em 1997, o estomizado tem direito a ter acesso às informações completas e imparciais sobre o fornecimento de produtos adequados disponíveis em seu país, bem como ter oportunidade de escolha entre os diversos equipamentos disponíveis para estomia sem preconceito ou constrangimento4. Em nosso País, a publicação da portaria nº 400, de 16 de novembro de 2009, institui as Diretrizes Nacionais para Atenção à Saúde das Pessoas Estomizadas no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, a serem observadas em todas as unidades federadas, respeitando as competências das três esferas de gestão4. Esta considerou a necessidade de garantir à pessoa estomizada a atenção integral à saúde por meio de intervenções especializadas de natureza interdisciplinar, e determinou que a Atenção à Saúde das Pessoas Estomizadas seja classificada em: Atenção às Pessoas Ostomizadas I e II.O serviço classificado como “Atenção às Pessoas estomizadas I”, deverá realizar ações de orientação para o autocuidado, prevenção de complicações nas estomias e fornecimento de equipamentos coletores e adjuvantes de proteção e segurança. E o serviço classificado como “Atenção às Pessoas Estomizadas II”, deverá realizar ações de orientação para o autocuidado, prevenção e tratamento de complicações nas estomias, fornecimento de equipamentos coletores e adjuvantes de proteção e segurança e capacitação de profissionais 4.Para facilitar e auxiliar a reabilitação da pessoa estomizada são oferecidos diversos produtos, dentre os quais se destacam os equipamentos coletores e adjuvantes de proteção de pele que possibilitam maior conforto e melhor qualidade de vida aos estomizados. Além do uso do equipamento correto, o estomizado requer um atendimento individualizado devido às transformações radicais ocorridas em sua vida5, que implicam em novas adaptações aos hábitos da vida diária e do funcionamento da dinâmica familiar. A adaptação à colostomia requer necessidade de autocuidado com o estoma, aquisição de material apropriado para contenção das fezes ou urina, adequação alimentar, convivência com a perda do controle da continência intestinal ou vesical, eliminação de odores, alteração da imagem corporal, bem como a alteração das atividades sociais, sexuais e cotidianas6. Neste contexto, o uso das bolsas coletoras dificulta o convívio social do estomizado, devido à preocupação com a eliminação dos gases, odor de fezes e vazamento das mesmas7.Do ponto de vista psicológico, “como existe [...] uma alteração importante na anatomia, o paciente frequentemente atravessa os vários estágios do pesar – choque, descrença, negação, rejeição, raiva e restituição. [...] Sua doença prolongada pode torná-los irritadiços, ansiosos e deprimidos” 8.Como forma de minimizar essa problemática, em 1984, Burchart e seus colaboradores criaram uma prótese descartável para controlar a eliminação de fezes ou fazer a continência intermitente da colostomia, tratandose, portando, do sistema oclusor9. Os sistemas continentes são utilizados para conseguir o controle voluntário das fezes e dos flatos 10. O sistema oclusor consiste em um tipo de tampão, descartável, flexível, disponível em uma ou duas peças, usado para ocluir a colostomia em sua extremidade distal, possibilitando o controle da incontinência intestinal para fezes e gases11. A descrição do oclusor, utilizado pelos integrantes da Associação dos Estomizados da Paraíba (AOEPB), corresponde a um dispositivo de uma peça nos tamanhos 35 mm e 45 mm de comprimento para medidas distintas de estoma de 20 mm a 35 mm e de 35 a 45 mm de diâmetro, respectivamente, composto de óxido de zinco, carboximetilcelulose sódica (CMC), pectina, borracha de butila, polipropileno atático, hidroxietilcelulose, gelatina, estireno-isoprenoestireno (SIS) e polisobutileno (PIB). Trata-se de um cilindro composto de espuma de poliuretano envolta em película hidrossolúvel pré-lubrificada. Possui filtro de carvão ativado integrado 12. O oclusor da colostomia pode ser usado pelas pessoas colostomizadas, desde que tenham colostomia terminal de apenas uma boca, localizada no cólon descendente ou sigmóide, ou seja, no hemicólon esquerdo. Os demais requisitos para sua utilização incluem: colostomia terminal sem complicações; diâmetro externo do estoma entre 20 e 45 mm e protrusão (altura) de até 25 mm; até três eliminações de fezes pastosas ou sólidas ao dia e condições gerais para o autocuidado 9. Para utilizar o oclusor, este deverá ser inserido no estoma sempre após a eliminação intestinal. O paciente deverá estar orientado sobre a importância do treinamento intestinal e, inicialmente, limitado a cada quatro horas por dia, aumentando gradativamente até atingir tempo de oito a doze horas por dia. Este período serve apenas como referência, pois o período de adaptação e a tolerância variam de pessoa para pessoa9.O tempo de permanência do sistema oclusor pode ser influenciado por fatores como dieta, consistência das fezes e quantidade de gases intestinais formados. O uso do oclusor possibilita ao portador de um estoma grandes possibilidades de se reinserir nas suas atividades diárias, reconquistar a autoestima e abandonar o sentimento de negação. O sistema oclusor da colostomia representa, portanto, um avanço tecnológico importante para a qualidade de vida de pessoas colostomizadas, tornando-lhes mais fácil a convivência diária com o estoma9. A qualidade de vida de todos os indivíduos em diversas nações tem sido uma preocupação recorrente. Não se trata de um conceito novo do termo, mas de um tema marcante do nosso tempo que vem provocando reflexões de natureza teórica e também influenciando as decisões de ordem prática da vida. A necessidade de melhorar a qualidade de vida das pessoas tem sido considerada na atualidade, um parâmetro fundamental na compreensão do binômio saúde-doença10.MétodoTrata-se de um estudo exploratório, com abordagem qualitativa, realizado na Associação de Estomizados da Paraíba (AOEPB), a qual está inserida no Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), localizado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), situado em João Pessoa – PB. Trata-se de uma associação pública, sem fins lucrativos, referência Estadual na assistência ao portador de estoma, composta por uma equipe multidisciplinar formada por enfermeira, médico, assistente social, psicólogo e nutricionista. A associação atende aos estomizados numa abordagem biopsicossocial com trabalhos individualizados e coletivos, além de distribuir as bolsas de colostomia que são fornecidas pela Secretaria de Saúde do Município. No período do estudo, o sistema oclusor estava em fase experimental de uso pelos associados, por meio de doação de um laboratório privado. A utilização desse sistema pelos associados era acompanhada por uma estomaterapeuta que presta assistência na associação.A população do estudo constitui-se das pessoas com estomas intestinais, membros da Associação dos Estomizados da Paraíba (AOEPB), que iniciaram o uso do sistema oclusor alternando ao uso da bolsa de colostomia, sob prescrição médica, totalizando seis colostomizados. Destes, quatro aceitaram participar e compuseram a amostra da pesquisa.Como técnica para coleta de dados, foi utilizado o grupo focal, por meio do qual o pesquisador reúne, num mesmo local e durante um certo período, uma determinada quantidade de pessoas que fazem parte do público-alvo de suas investigações, tendo como objetivo coletar informações acerca de um tema específico, a partir do diálogo e do debate13.A coleta de dados ocorreu no mês agosto de 2011, em reunião programada do grupo, onde os participantes preencheram um formulário referente à caracterização dos sujeitos e, em seguida, participaram do grupo focal. Para sua realização, foi utilizado um roteiro que serviu como guia norteador do diálogo sobre o tema em questão, incluindo questionamentos aos participantes sobre o significado atribuído à colostomia, às suas experiências com o uso da bolsa de colostomia e com o uso do sistema oclusor, além das mudanças ocorridas em suas vidas como o uso deste dispositivo. Para o registro das informações, foi utilizada a técnica de gravação e, para preservar o anonimato dos participantes, estes foram identificados por pseudônimos. O desenvolvimento da pesquisa foi precedido pela aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HULW/UFPB, com parecer de Nº 406/11. Foram respeitados os preceitos éticos da Resolução nº 196/96, do Conselho Nacional de Saúde14, observando-se a livre aceitação dos sujeitos em participar do estudo, e a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.Os dados referentes à caracterização dos sujeitos foram apresentados de forma descritiva, por meio de frequências absolutas. Os depoimentos dos sujeitos foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo, conforme Bardin14, que a descreve como:Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/ recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (p. 48).Para operacionalização desse método Bardin15, propõe-se o seguimento de três polos cronológicos: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. Na fase de pré-análise, foi adotada a leitura “flutuante”, que permitiu estabelecer contato com os conteúdos dos discursos, deixando-se invadir por impressões e orientações. Estes discursos, captados por meio de gravação durante o grupo focal, e transcritos na íntegra, representaram o corpus de análise. A etapa de exploração do material envolveu o tratamento do material por meio de operações de codificação, decomposição, ou enumeração dos dados. A codificação correspondeu a uma transformação sistemática dos dados brutos do texto, com agregação em “unidades de registro”. Uma vez identificadas as unidades de registro, o passo seguinte consistiu na categorização dessas, classificando-as por semelhança ou analogia, em categorias temáticas15, cujos discursos representativos foram analisados à luz da literatura sobre o assunto.Resultados e Discussão1. Caracterização dos sujeitos da pesquisaO grupo focal foi formado por quatro colostomizados, com idades mínima de 39 anos e máxima de 73 anos; sendo três do sexo masculino e uma do sexo feminino; estado civil casados (02), solteiro (01), companheiro (01); religião católica (03), cristã (01); três cursaram o ensino médio e um cursou o terceiro grau. Quanto à renda familiar, dois participantes recebem R$ 700,00 e 800,00, e os outros dois R$ 2.000,00 e 4.500,00, respectivamente. Todos foram submetidos à colostomia após retirada de tumor maligno intestinal, e um deles referiu metástase para o fígado. Uma das participantes informou ter sido submetida à colostomia por duas vezes, sendo o último procedimento realizado há oito meses e ainda encontra-se em tratamento quimioterápico. O tempo de realização da colostomia foi de 08 meses, 2 anos e 5 meses, 09 e 23 anos, respectivamente. Todos fazem uso de bolsa de colostomia alternando com o sistema oclusor, como experiência inicial oportunizada pela Associação de Ostomizados do Estado da Paraíba que iniciou a disponibilização deste dispositivo, conforme doação de laboratório privado, respeitando os critérios adequados ao seu uso. O tempo médio de uso do sistema oclusor, pelos participantes da pesquisa, foi de dois meses.2. Categorias temáticas emergentes dos discursosA partir da leitura do conteúdo expresso pelos sujeitos da pesquisa foi possível definir “unidades de análise” ou “unidades de registro” (frases, temas ou diálogos), as quais foram categorizadas por semelhança ou analogia, e de acordo com critérios semânticos, em categorias temáticas, conforme se segue.Significado atribuído à colostomiaNa identificação e contextualização dos sujeitos da pesquisa sobre o significado atribuído à colostomia, surgiram duas categorias: impacto na vida e enfrentamento. Na primeira categoria os elementos temáticos destacam o impacto emocional causado pela colostomia em suas vidas, conforme as transcrições que se seguem:É um impacto na vida da pessoa [...] eu fiquei complexado, sinceramente fiquei complexado com esse negócio de colostomia, eu não sabia o que era, vim saber depois de operado. (CURRUPIÃO)O primeiro ano foi difícil [...] no inicio tinha vergonha e me isolava, minha sorte foram meus amigos que me acompanhavam e me tratavam numa boa, eu sabia que estava incomodando, porque tinha o cheiro forte dos gases, o cheiro das fezes (...) eu ficava incomodado e preocupado com eles. (CURIÓ)No princípio não foi fácil, não é fácil para ninguém, principalmente para mim como mulher [...] tenho namorado, estava muito preocupada, ele não tinha visto ainda a colostomia, apesar de saber que ele não dá importância, mas sei que de forma geral o homem é muito ligado à estética...(DIAMANTE)Independentemente de ser temporária ou definitiva uma estomia acarreta alterações profundas no modo de vida das pessoas submetidas a este tipo de cirurgia, considerando que sua fisiologia gastrointestinal é modificada bem como sua autoestima, sua imagem corporal, entre outros aspectos6. Consequentemente, isso gera um impacto em suas vidas que requer tempo para adaptação, suporte familiar e social, e orientações adequadas por parte dos profissionais de saúde. Outro aspecto ressaltado pelos sujeitos da pesquisa foi a limitação de atividades e a condição de dependência.Para mim é muito traumático, porque a minha vida toda desde os oito anos de idade, trabalhava e trabalhei muito, hoje em dia não posso mais trabalhar, não posso pegar peso, não posso fazer isso, não posso fazer aquilo [...] segundo o próprio médico que me operou. Com certeza a gente fica restrito a determinadas coisas (CURRUPIÃO).Eu pensava que não podia sair, não podia namorar, eu listei tudo que não podia fazer. (CURIÓ)Eu dependia da minha irmã para tudo, até para trocar a bolsa. (DIAMANTE).A limitação de atividades citada pelos colostomizados é algo que lhes incomoda, considerando as mudanças no estilo de vida, principalmente nas atividades laborais. As pessoas estomizadas têm grandes dificuldades na volta ao trabalho, pois se sentem inseguras para continuar cuidando da estomia e ainda trabalhar. A ausencia de atividades laborativas pode levá-las a ociosidade e ao isolamento social16. Este, por sua vez, é particularmente prejudicial ao colostomizado e reflete a dificuldade de adaptação à colostomia. Observa-se que após a alta hospitalar, os estomizados e seus familiares apresentam dificuldades para dar continuidade ao cuidado no domicilio, e neste processo, a paciência e a compreensão da familia são fundamentais para o processo de aceitação e autocuidado pelo paciente 17.Após o impacto inicial da cirurgia o colostomizado tende a desenvolver reações de enfrentamento revelando a necessidade de encarar a realidade e buscar apoio que auxilie na sua adaptação à nova condição. Nesta busca, os pacientes encontram na Associação de Estomizados um espaço para trocar experiências e buscar apoio para favorecer a adaptação dos mesmos à colostomia.Apesar dos pesares e de muitos dizerem que levam uma vida normal, todos tem problema, o que adianta é a pessoa encarar a realidade(CURRUPIÃO).Quando eu vim para a associação pela primeira vez, eu fiquei outra pessoa, já sai feliz, outra pessoa... Eu pensava que não podia sair, não podia namorar, eu listei tudo que não podia fazer, aí depois da associação eu vi que não era nada daquilo, restrição todo mundo tem, tem seus limites, hoje tenho profissão, sou cabeleireiro, conheci uma pessoa, me casei, tenho um filho com ela, não moro com ela mais hoje, me separei e a colostomia não foi o motivo da minha separação (CURIÓ).Estou estomizada pela segunda vez há oito meses, na primeira vez foi muito mais difícil [...] dessa segunda vez frequento associação, sou mais independente, eu mesmo troco a bolsa (DIAMANTE).As pessoas estomizadas buscam uma rede de apoio que é extremamente importante para enfrentar as diversas dificuldades, destacando-se à familia e a Associação dos Estomizados. Esta última é o local onde se sentem normais, capazes de manifestar seus sentimentos reprimidos, trocar experiências e encontrar soluções para seus problemas17 .Assim, participar de um grupo de apoio permite ao homem o desenvolvimento de suas habilidades nas suas realizações pessoais, execução de tarefas, divertir-se, oferecer e receber ajuda. É comum no interior do grupo o desenvolvimento de um clima de solidariedade, companheirismo e troca de experiências similares18.Experiências com o uso da bolsa de colostomiaNo item experiências com o uso da bolsa de colostomia emergiu a categoria processo de adaptação à bolsa, onde ficaram evidentes dois elementos temáticos: dificuldades iniciais e ajustamento ao uso da bolsa, denotando a relação com as categorias relativas ao significado da colostomia, imputadas pelos colostomizados.Inicialmente as bolsas coletoras eram descartáveis, não continham placa com resina protetora de pele, nem filtro para odor dos gases e fezes, o que dificultava ainda mais a adaptação do estomizado a sua nova condição física, pois além da disfunção fisiológica teria que fazer uso de um dispositivo que não oferecia o mínimo de segurança e conforto, e as dermatites periestomal eram muito mais frequentes. Atualmente estão disponíveis no mercado grande variedades de bolsas coletoras, com diferentes tamanhos, com filtro anti-odor, placas com composições que protegem a pele periestomal contra os efeitos nocivos do conteúdo intestinal e com apresentações planas e convexas de forma a se adaptarem às necessidades da pessoa estomizada.Entretanto, o uso das bolsas coletoras dificulta o convívio social do indivíduo estomizado devido à preocupação frequente com eliminação e odor dos gases e das fezes, sentimento constante de vergonha, insegurança e visão negativa de si7.Já passei por todas as experiências, tenho 23 anos de estomizado [...] o primeiro ano foi difícil, porque eu usava bolsa descartável, era horrível tinha que trocar direto, queimava a pele, tinha vergonha, me isolava [...] eu sabia que estava incomodando, porque tinha o cheiro forte dos gases, cheiro das fezes ... A bolsa de karaya era horrível, não filtrava os gases, a bolsa ia até o joelho, eu ficava incomodado (CURIÓ).A princípio não foi fácil, não é fácil para ninguém, principalmente para mim como mulher, gosto de usar calça jeans, usar biquíni, eu acho feio a bolsa, muito feio mesmo, eu não sou casada, mas tenho namorado, por isso eu estava muito preocupada, ele estuda fora, e não tinha visto ainda, ele sabe da minha historia, da minha cirurgia, mas ele não tinha visto ainda, apesar de saber que ele não dá importância, mas sei que de forma geral o homem é muito pela estética. (DIAMANTE).Posteriormente demonstram ajustamento ao uso da bolsa, conforme seus relatos:Hoje tenho uma vida normal sou como qualquer pessoa; tem dias que acordo olho para mim e não acredito que tenho esse negócio (colostomia) acho estranho, mas no dia a dia é normal, me acordo limpo minha bolsa, vou para meu trabalho normal, e tudo bem. (CURIÓ).Há dois anos e cinco meses que estou cirurgiado e sempre usei essa bolsa de colostomia, tem algumas que não servem, descolam com facilidade, já tem outras que aderem bem à pele. Tenho me dado bem com a bolsa (BEM TE VI).A estomia e o equipamento coletor imprimem mudanças concretas na vida do estomizado, que requerem dos mesmos tempo para aceitação e aprendizado do autocuidado19.Experiência com o uso do sistema oclusorQuanto à experiência dos participantes com o uso do sistema oclusor, as categorias enfatizaram inicialmente as dificuldades com o sistema oclusor com relação ao ajuste ao funcionamento intestinal e a insegurança em relação ao sistema oclusor, conforme fica claro nas falas dos sujeitos:Acho a idéia do oclusor ótima, só que no momento não consegui me adaptar a ele, quando comecei os primeiros dias com o oclusor eu passei um bom tempo, algumas vezes precisei trocar com três horas de uso porque, de repente, vazaram fezes. Passei a usar a alternar com bolsa de colostomia, venho me adaptando, estou tentando ver se me acomodo com o oclusor, mas ainda não consegui me adaptar cem por cento a ele por causa do problema de gases, meu intestino está produzindo muitos gases, já mudei a alimentação, e sempre produzo muitos gases. [...] porém, tenho uma certa falta de confiança, eu acho que num momento de dificuldade ou de necessidade, ou um imprevisto, esse oclusor não vai sustentar, eu acho né ...(CURRUPIÃO).As dificuldades iniciais com o sistema oclusor denotam a necessidade de adaptação ao dispositivo, a qual é de suma importância, requer ajustamento gradativo, e que a pessoa em fase de treinamento seja conduzida lenta e cuidadosamente neste processo para que não perca o estímulo8. Apesar do pouco tempo de uso os colostomizados e das dificuldades de adaptação, os usuários já percebem vantagens no sistema oclusor como: diminui o volume atribuído à bolsa, melhora o aspecto higiênico, controla o odor, proporciona segurança e conforto para atividade sexual, dar mais liberdade de movimento e favorece a independência, proporciona segurança e eleva a autoestima, conforme se observa em suas falas.Apesar das minhas dificuldades com o seu uso, eu acho que o oclusor é muito boa coisa, é excelente porque diminui volume, o aspecto higiênico aparentemente é bem melhor (CURRUPIÃO).Eu me senti mais a vontade com o oclusor, até para fazer movimentos, com a bolsinha meus movimentos eram controlados, se eu levantasse demais os braços ela aparecia, com o oclusor não, porque é na altura do umbigo, com ele posso levantar o braço quando estou no ônibus só aparece um pouco da barriga, mas não mostra o oclusor; se sair na noite para dançar, beber e me divertir, com o oclusor eu tenho mais liberdade de movimentos. Quando vou sair para balada conhecer alguém diferente, eu uso o oclusor, é uma maravilha, eu me sinto seguro, eu não vou precisar ficar com aquele negócio lavando, vou ao banheiro só para ver como é que está, ponho a mão para ver se tem volume se tem alguma coisa diferente, se está largando, vou ao banheiro de vez em quando só para olhar; com o oclusor não tem odor. Com oclusor na hora de amar não tem problema, com a bolsa incomoda, tem que ficar movendo de um lado para outro. (CURIÓ).Quando o oclusor foi apresentado a mim, mudou completamente minha autoestima, pois com ele o estoma fica fechadinho, é mais higiênico do que a bolsa, muito mais, e tem a sensação de que voce controla o seu intestino, a gente não fica a mercê de uma bolsa de colostomia. Para mim está sendo muito bom, o oclusor mudou minha vida no relacionamento, na independência, com ele dá para conciliar uma vida melhor. Não me acho vaidosa ao extremo, mas como toda mulher gosto de estar bem vestida, usar um jeans normal, dar um abraço e ninguém vê (a bolsa de colostomia), usar babydool, o oclusor levantou a minha autoestima muito... (DIAMANTE).Com o oclusor a gente se sente mais independente, não fica olhando para a bolsa, é mais higiênico, não faz volume, mas voce não pode tirar a bolsa completamente, tem que ficar alternando com o oclusor. (BEM TE VI).Apesar do pouco tempo de uso, os participantes da pesquisa referem benefícios com o uso do sistema oclusor, entretanto, reconhecem a importância da bolsa coletora para usá-la em alternância a este. Isso demonstra que o uso do oclusor é um processo que requer adaptação gradativa para que o usuário adquira segurança em relação ao seu uso.ConclusãoOs resultados mostram que a colostomia representa um grande impacto na vida dos pacientes, o qual, gradativamente, vai sendo minimizado com a adaptação a nova condição de colostomizado, o que inclui a adaptação aos dispositivos para controle da incontinência intestinal. Percebe-se que os pacientes apresentam dificuldades para se adaptarem a bolsa de colostomia, e mesmo adaptados descrevem dificuldades com o seu uso, principalmente nos aspectos estéticos e pela insegurança que provocam em alguns, pelo medo de vazamentos; e de causar incômodos nas pessoas ao seu entorno. Quanto ao sistema oclusor, observa-se que os usuários também apresentam dificuldades para adaptação inicial. Porém, devido à independencia que proporciona em vários aspectos da vida íntima e social, acaba melhorando sobremaneira a sua qualidade de vida. Os depoimentos favoráveis ao uso do sistema oclusor incentivam as Instituições de Saúde Pública à distribuição gratuita deste dispositivo, mediante o reconhecimento pelos usuários, de suas vantagens e das melhorias em vários aspectos de sua vida. Convém ressaltar que após a realização deste estudo a Instituição padronizou o uso do sistema oclusor, disponibilizando-o para os associados. Independente do dispositivo utilizado, ressalta-se a importância do apoio da família e das redes de apoio no processo de reinserção social do colostomizado, partindo-se do pressuposto de que o impacto inicial acaba acarretando isolamento social. Também pela oportunidade de troca de experiências no grupo e educação continuada junto à equipe multiprofissional.AgradecimentosÀ Coloplast do Brasil e ao Distribuidor de Material Médico Hospitalar - Tecnocenter João Pessoa – PB, pela disponibilização gratuita dos materiais usados no estudo.

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Published

2016-03-23

How to Cite

1.
Diniz IV, Campos MG das CA, Vasconcelos J de MB, Martins DL, Maia F de SB, Caliri MHL. Artigo Original 2 - Bolsa de Colostomia ou Sistema Oclusor: Vivência de Colostomizados. ESTIMA [Internet]. 2016 Mar. 23 [cited 2024 Mar. 28];11(2). Available from: https://www.revistaestima.com.br/estima/article/view/84

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